Cascavel em Alta Velocidade:
50 Anos de Automobilismo
Centenas de imagens e muitas histórias vibrantes
Leia, abaixo, a introdução do livro
Introdução
Carros, mecânicos e ases
Os 50 anos do automobilismo em Cascavel
No princípio era o motor, que veio substituir a
tração animal. O Four-stroke do
engenheiro Nikolaus Otto e seu colaborador Gottlieb Daimler, em 1885, saltou
das motocicletas para o primeiro automóvel, construído por Karl Benz. Outros
construtores viriam e, com eles, a busca por um melhor desempenho. Esta
necessidade é a mãe da invenção das provas para atestar quais modelos seriam
mais rápidos e seguros.
O obelisco da Praça Getúlio Vargas, em Cascavel,
está relacionado com a história do automobilismo porque foi ali que Jeca
Silvério estacionou pela primeira vez seu automóvel Ford Bigode[1],
iniciando a presença dos motores na vida cascavelense, em 28 de março de 1930.
A Ford
foi a primeira indústria automobilística a se instalar no Brasil (1919). A II
Guerra Mundial se encarregou de forjar uma indústria nacional de autopeças,
gerando a tradição de mecânicos vivazes, com soluções criativas para a
substituição de componentes. E Getúlio Vargas, já convertido à democracia, em
1952, foi quem disciplinou o desenvolvimento do setor ao determinar que os
veículos estrangeiros “só poderiam entrar no Brasil totalmente desmontados, e
sem componentes que já fossem fabricados por aqui”.
Não sem motivo, na primeira prova
automobilística de Cascavel o pioneiro Jeca Silvério recebeu uma emocionante
homenagem, levado pelos rapazes para um passeio pela pista da prova em carro
aberto. Carros antigos, praticamente reconstruídos pelos mecânicos, desfilaram
antes dessa prova – o passado abrindo caminho ao presente.
A professora Ottilia Schimmelpfeng passeou num
desses carros pioneiros em Cascavel com seu pai, o prefeito iguaçuense Jorge
Schimmelpfeng, em 1922. Ainda não era a vila de Cascavel, que só começaria a
ser formada em 1930 no local em que seria erguido o obelisco.
Ali era um trecho da Estrada Estratégica, que o
coronel Schimmelpfeng acabara de construir. Ao acampar junto ao Rio Cascavel,
Ottilia se assustou com a macacada que fazia algazarra na mata fechada. Esse trecho
da estrada passava ainda pelo chamado Cascavel Velho, na época uma propriedade
rural. A cidade só viria a se formar na Encruzilhada dos Gomes, em 1930.
O colonizador Miguel Matte, homenageado com o
nome de Matelândia, também transitou por ali com seu automóvel. Matte e
Schimmelpfeng, até onde se tem registro, foram os primeiros a circular com
automóvel por aqui. Jeca Silvério, assim registrado, foi o terceiro.
Como os primeiros automóveis trafegavam em ruas
e estradas em precaríssimo estado, Cascavel tem uma bela tradição de mecânicos
que faziam milagres para pôr em circulação os carros “bichados” que lhes
traziam. Alguns mecânicos já foram homenageados, como Hermes Vessaro, que dá
nome a uma rua e a uma escola, e Zilmar Antônio Beux, que dá nome ao autódromo
que ele idealizou e construiu ao lado de amigos e sócios – hoje um dos mais
importantes bens patrimoniais do povo de Cascavel.
Essa tradição começa com Estanislau Chervinski,
o Estacho, “que evoluiu de uma
ferraria do sogro Valentim Vichoski, instalada em frente ao atual Posto Shell,
aí pelos anos 30 ou 40. Ele também possuía um pé-de-bode (Ford 1925) que também atendia a pequena população de Cascavel. Este
improvisado táxi, em razão de suas características mecânicas (alto, aro 21,
rodas estreitas) possibilitava a penetração nas estradas e picadas existentes.
Eu tive oportunidade de viajar algumas vezes neste valente veículo. Essa
oficina mecânica também abrigou o Tuiuti em muitas festas, antes da construção
de sua primeira sede na Rua Paraná”[2].
Filho de poloneses, Estacho nasceu em São Mateus do Sul, de onde foi para Foz do Iguaçu
trabalhar na construção da Estrada das Cataratas, a serviço do governo federal.
Vindo para Cascavel no final da década de 1930, Estacho se casou com Edvirdes
Vichoski, filha de família pioneira na região, e se estabeleceu como ferreiro e
mecânico, além de abrir um armazém. Seu táxi pé-de-bode fazia a linha do
Piquiri e é a origem da tradição da família no transporte escolar. Morreu em 4
de setembro de 1984[3].
“Na década de 40 vieram vários motoristas, uns
para as serrarias do Lupion e outros com a TH Marinho, esta uma construtora da
estratégica (atual BR-277). Estes motoristas e operadores de máquinas, faziam
serviço de mecânica de seus caminhões e máquinas”[4].
**
Até a paixão pelos motores tomar conta de
Cascavel, o espírito esportivo dos cascavelenses se limitava ao futebol e às
corridas de cavalos. “As carreiras envolviam muita gente. Eram políticos,
empresários, fazendeiros. As carreiras eram feitas com dois animais, numa raia
de mais ou menos uns 500 metros. (...) Meses antes das carreiras, os
apostadores e preparadores já se instalavam no local e por lá ficavam jogando
baralho, comendo churrasco e bebendo.”[5].
Exatamente 70 anos antes da primeira prova
automobilística promovida em Cascavel, idealizada pelo jovem proprietário da
revista Oeste, Luís Carlos Biazetto,
e seu amigo José Marcos Mion, ambos estudantes em férias na época em que a
ideia brotou, foi também uma revista que organizou a primeira competição
motorizada de que se tem notícia.
Le Petit
Journal
promoveu em 1894 um teste automotivo de confiabilidade entre Paris e Rouen para
verificar quais seriam as “carruagens sem cavalos” com melhor desempenho entre
69 competidores. Acelerando a quase 20 quilômetros por hora, quem chegou
primeiro foi o conde Jules-Albert de Dion, desclassificado por usar um
acessório proibido.
Assim, o vencedor proclamado foi Georges
Lemaître, pilotando um carro Peugeot de 3 hp. Já a primeira prova
estadunidense, promovida em Chicago no ano seguinte, contou com quatro carros a
gasolina e dois elétricos. Venceu o primeiro carro construído com motor a
gasolina, pilotado por seu inventor, Frank Duryea.
No Brasil, o automobilismo começa com uma
importação: pelas mãos do inventor do avião, Alberto Santos-Dumont, chega em
1891 o primeiro automóvel a circular no País. Esse primeiro automóvel não
chegou a ser usado para competições automobilísticas, é certo, mas ajudou
Santos-Dumont na maior corrida de sua existência: ao montar seu 14-Bis, Santos-Dumont conseguiu largar
na frente da disputa pela primazia de inventar o avião, em 1906.
A primeira prova automobilística oficial no
Brasil aconteceu em 26 de julho de 1908, em São Paulo, diante de um
surpreendente público de 10 mil pessoas no trajeto que ia do campo do Parque
Antártica até o centro da cidade de Itapecerica da Serra, ida e volta,
perfazendo 75 quilômetros. O vencedor foi o Conde Sylvio Álvares Penteado, a
bordo de um Fiat.
Todos os carros eram importados da Europa ou
Estados Unidos até 1931, quando Cássio Muniz construiu o primeiro carro de
corrida do Brasil, com toda a mecânica nacional. Um carro nacional, mas nem
tanto: o motor era o importado Chevrolet.
O automobilismo brasileiro surge como a esperança de um Brasil independente e
desenvolvido – acelerado rumo a um destino de riqueza e conquistas.
Cumprindo o ritual exigido pela Fédération
International de l’Autimobile (FIA), acontece então o I Grande Prêmio Cidade do
Rio de Janeiro no ano de 1933, no Circuito da Gávea. Até aquele momento os circuitos
do Brasil eram organizados nas ruas das grandes capitais ou nas primeiras
rodovias. Nesse evento, organizado pelo Automóvel Clube do Brasil (entidade que
controlou o Automobilismo e inclusive as leis de trânsito no País), o vencedor
foi o brasileiro Manuel de Teffé, pilotando um Alfa-Romeo.
Por essa época, a cidade de Cascavel estava
engatinhando. Vinte anos depois dessa primeira prova no País, em 1953, o
Município de Cascavel estreia politicamente nas pistas administrativas do
Paraná, com a mesma vontade de acelerar rumo ao futuro. Dez anos mais se passam
até que o Município dê seus primeiros passos, no automobilismo, depois de
vencer o trauma de um terrível acidente, representado pelo incêndio que devorou
sua Prefeitura, em 1960. É assim que, em 1963, como já havia acontecido com a
primeira prova mundial, um grupo de rapazes ao redor de uma revista tramava o
feito mais marcante de suas vidas.
[1] Ford Bigode – No Ford Modelo T, as duas alavancas,
opostas, formavam a figura de um bigode. Quando o nome pegou, os modelos
fabricados no Brasil passaram a mostrar, no ornamento do capô, a figura de um
bigode.
[5] Alberto Rodrigues
Pompeu, entrevista ao jornalista Jairo Eduardo Fabrício Lemos, Pitoco número 1000, 25 de outubro de
2005.
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